17 de janeiro de 1920
Tinha 19 anos quando a minha vida se alterou. Tinha 19 anos quando a
paz foi quebrada. Tinha 19 anos quando milhares de pessoas morreram
inocentemente. Tinha 19 anos quando a Grande Guerra começou.
Eu era um rapaz jovem que vivia na ignorância. Acreditava que vivíamos
todos em comunhão, tinha falsas esperanças. Pensava que podia mudar o mundo,
pensava que todos éramos iguais.
Tudo mudou quando ouvi o sussurrar da temida sineta. A Guerra tinha
começado. Por todo o lado havia comandantes que reuniam os seus exércitos.
Impuseram-me, como a todos os outros soldados, a vontade de lutar pela pátria
francesa. Foi orgulhoso por ir defender a Nação que parti para a Guerra,
desconhecendo o sofrimento pelo qual iria passar. Ainda me lembro da minha
ingenuidade, nunca mais me senti assim.
Foi em 1914 que o meu batalhão viajou para o Norte de França, emproado
por ir combater pelo símbolo da independência francesa. Chegámos ao Marne e as
nossas ilusões rapidamente se desvaneceram. As tropas alemãs tentavam conquistar
o nosso território e instalara-se um ambiente de impasse. Escavaram-se as
trincheiras e com elas a dor e a tortura.
Vivíamos como toupeiras, prisioneiros de um mundo subterrâneo. Todos
os dias eram um completo martírio. O meu corpo estava inundado de pulgas. Os
piolhos apoderavam-se do meu crânio. Já não tínhamos vontade de viver, éramos
mortos-vivos prisioneiros das profundezas.
A 22 de junho de 1916 a frente alemã lançou gás fosgénio para as
trincheiras francesas. Vidas inocentes foram abruptamente levadas pela
substância tóxica. As nossas tropas tinham de reagir a este atentado.
Assim, na contraofensiva francesa, o nosso comandante relembrou-nos
que tínhamos de avançar com bravura e não recear a morte. Sem qualquer outra
opção, pus os trajes bélicos. Fui rapidamente buscar a minha metralhadora lewis
e guardei a granada de mão. Temendo o futuro, avancei receosamente para a terra
de ninguém.
Não conseguia andar, todo o meu corpo fraquejava e a minha alma
estremecia. As granadas rebentavam ao meu redor e os tiros ensurdeciam-me. A
terra tornava-se vermelha e eu corria desesperadamente sobre cadáveres, ansiava
o fim daquele massacre. Sangue puro e inocente era derramado. As cidades
ficaram desertas, não havia alegria. Tudo estava banhado de tristeza.
Irei sempre relembrar-me desse dia em que muitas mulheres perderam os
seus maridos, em que muitas crianças perderam os seus pais. Mudou-me. Tornou-me
consciente da crueldade humana.
Os ruídos estrondosos, o enorme sofrimento e as inúmeras perdas de
vidas nunca me vão abandonar. Nunca me esquecerei da Guerra.
Carolina Gomes
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